A tradição de todos os povos da terra inclui o vampirismo; contos de vampirismo são encontrados entre os mais antigos fragmentos da literatura da humanidade.
No século dezenove um escritor inglês, Bram Stoker, publicou um romance fantástico chamado “Drácula” . Neste romance ele inclui dados folclóricos cuidadosamente colhidos em torno do fenômeno do vampirismo. Embora o enredo do romance fosse insosso e pueril, a figura central do vampiro, o “Conde Drácula”, fascinou de tal forma o subconsciente de pessoas que se consideravam racionais e civilizadas que hoje o nome “Drácula” é imediatamente associado com vampirismo.
No século dezenove um escritor inglês, Bram Stoker, publicou um romance fantástico chamado “Drácula” . Neste romance ele inclui dados folclóricos cuidadosamente colhidos em torno do fenômeno do vampirismo. Embora o enredo do romance fosse insosso e pueril, a figura central do vampiro, o “Conde Drácula”, fascinou de tal forma o subconsciente de pessoas que se consideravam racionais e civilizadas que hoje o nome “Drácula” é imediatamente associado com vampirismo.
Centenas literalmente de filmes e peças teatrais tem sido produzidos, com sucesso, em torno do tema; romances imitando a obra de Stoker ainda são editados em todos os países.
Talvez a maior fascinação da obra do romancista inglês que nunca mais escreveu coisa alguma tão bem sucedida, seja a riqueza de dados folclóricos do interior europeu sobre o vampiro. Os fatos de Stoker quanto ao vampiro, sua conduta, sua manifestação, são extremamente bem descritos.
A tradição de que o alho afugenta o vampiro; de que este não pode entrar numa residência sem convite de alguém que lá se encontre; de que vampirismo é infeccioso; de que vampiro pode assumir diversas formas animais; de que a única maneira de matar um vampiro é destruir o corpo, ou pelo menos inutilizá-lo para as funções biológicas; tudo isto está fundamentado no folclore de diversas nações da Europa.
Até que ponto se trata de fatos, no senso científico da palavra, e até que ponto se trata de superstição? Vejamos, ponto por ponto.
Que o alho é repelente para certos tipo de entidades do mundo sutil é um fato conhecido de ocultistas; mas não decorre disto, absolutamente, que deva ser repugnante aos vampiros. Suponhamos, por exemplo, que o vampiro seja de origem italiana; poderíamos sequer pensar que o alho lhe seja repelente, quando a cozinha de seu país usa tão liberadamente este tempero?
Não se deve julgar que o parágrafo acima foi escrito como pilhéria. O condicionamento cultural de um indivíduo é sempre um fator em sua forma de manifestação em qualquer plano, mesmo no caso de um vampiro. Um cineasta de talento, Roman Polanski, recentemente fez um filme sobre vampiros. Uma das cenas, uma donzela amedrontada ergue um crucifixo em frente do vampiro. Este ri deliciado e lhe diz: “Você está com o vampiro errado!” este vampiro do filme, era de origem judaica.
Embora a cena seja uma pilhéria, o filme é uma comédia de humor negro. O cineasta tocou num ponto de grande importância oculta: os símbolos de uma determinada religião só amedrontam àqueles que acreditam na vaidade daquela religião. Portanto, é totalmente inútil tentar usar símbolos cristãos para afugentar entidades que pertencem a outras correntes religiosas, principalmente os judeus, que estão cansados de saber que nunca existiu nenhum Jesus Cristo, e que a carreira inteira do catolicismo romano está baseada numa hábil vigarice.
Quanto a impossibilidade de um vampiro penetrar em uma residência sem o consentimento de alguém que lá resida, isto, como já dissemos anteriormente, é uma superstição suja base encontra-se no fato de que ninguém pode ser magicamente atacado sem que haja um ponto de afinidade entre sua estrutura anímica e a entidade atacante. Mas é claro que um vampiro, ou qualquer outro tipo de entidade, pode penetrar em qualquer ambiente que não esteja magicamente defendido. Para a entidade permanecer ali, entretanto, é necessário que encontre um ponto de apoio, uma afinidade, e a superstição quanto à entrada do vampiro está baseada nisto.
De todas as superstições em torno do vampiro, só três são importantes do ponto de vista científico:
1 – A idéia de que o vampiro pode assumir diversas formas animais.
2 – A idéia de que é necessário destruir o corpo físico do vampiro, ou inutilizá-lo, para as possibilidade de funções fisiológicas.
3 – A idéia de que o vampiro é contagioso.
A importância destas superstições consiste em que elas não são superstições, mas sim fatos verificáveis pelo trabalho oculto.
Antes de entrarmos em detalhes quanto aos três pontos acima seria conveniente observar que o vampirismo é um fenômeno que se manifesta com diversos graus de gravidade. Todos estamos familiarizados com a experiência de que a aura de determinadas pessoas nos exaure de energia; e diga-se de passagem que mesmo esta ocorrência tão corriqueira não é invariável. Por exemplo, uma pessoa nossa amiga pode, em determinada ocasião, estar deprimida ou magicamente enfraquecida, e em tal ocasião tenderá a absorver nossa energia enquanto em outra ocasião talvez se dê justamente o contrário, e nós absorvemos a sua. Este tipo de intercâmbio magnético deve ser considerado normal. Faz parte das flutuações normais das forças vitais da sociedade humana.
Também, uma pessoa que sofreu um esgotamento nervoso, ou que está se recuperando de uma grave moléstia pode ocasionalmente estar tão enfraquecida que absorve o prana de outras pessoas, como de animais e plantas. (As plantas principalmente, são extremamente sensitivas ao intercâmbio da energia vital, e tanto são capazes de fornecê-la quanto de absorvê-la. Daí dependendo de nosso temperamento, a influência vitalizante de florestas e bosques, ou a influência deprimente das regiões pantanosas e insalubres.)
Tais, casos, se bem que tecnicamente caiam na definição de vampirismo, não chegam a ser patológicos no sentido exato da palavra. O verdadeiro vampirismo consiste na absorção proposital de energia vital de seres humanos para prolongar a existência de entidades que, sem este parasitismo, se dissolveriam e morreriam como parte do processo evolutivo normal.
É por este motivo que é conveniente destruir o corpo de um vampiro. O Cadáver de uma alma apegada à terra (e isto é essencialmente um vampiro) torna-se um foco magnético, uma espécie de base de operações da entidade astral. Por estranho que pareça aos profanos, não é o corpo astral que é a base de manifestação do corpo físico, mas justamente o contrário. O corpo astral é como um carro, e o corpo físico a sua garagem. Por isto, o vampiro sempre busca ficar em contato com o corpo físico; e se possível, evitar a decomposição deste.
Os antigos egípcios sabedores desta relação íntima entre o astral e o material, procuravam preservar o mais possível o cadáver dos mortos, principalmente dos sacerdotes e nobres.
A mumificação tinha como finalidade preservar, ou auxiliar a preservar, a integridade do corpo astral dos falecidos, durante o maior espaço de tempo possível.
Não temos aqui espaço para entrar a fundo neste assunto; e o propósito dos egípcios não era absolutamente encorajar o vampirismo. Entretanto, as lendas dos vampiros estão relacionadas com casos lamentáveis de baixos iniciados egípcios que, uma vez esgotados os recurso naturais de preservação do astral, laçavam mão das energias vitais de homens e mulheres vivos.
A idéia, portanto, que a destruição do corpo do vampiro é uma maneira eficaz de destruir seus poderes não deixa de ter sua validade; mas é tolice acreditar que a destruição do cadáver é imediatamente seguida pela morte do vampiro. O corpo astral sobreviverá, embora sem a base material que o estabilizava. Entretanto, uma vez esgota a sua carga de energia, ele se dissipará lentamente na Segunda Morte. É este o destino que apavora a entidade que se manifesta como o vampiro, e se puder adiá-lo através da absorção da energia vital de outros seres humanos, ela assim fará.
Do que foi escrito acima deduz-se que é mais seguro, diremos até mais higiênico, acelerar a dissolução do corpo físico dos mortos do que preservá-lo. O hábito de enterrar cadáveres dentro de caixotes (e freqüentemente embalsamados!) é uma estupidez mesmo do ponto de vista da ecologia. A carne em decomposição se subdivide em diversas subestruturas organo-químicas que (por exemplo) tornam o solo mais fecundado e mais propício a vegetação. Os cadáveres deveriam ser enterrados nos campos de plantio, ou em jardins. Poderiam ser primeiramente legados a hospitais, para fins científicos ou de transplantes de órgãos; e após assim utilizados para auxiliar os vivos, poderiam ser convertidos em proteínas e adubo. A reciclagem é um processo normal da natureza, e um cemitério é um crime contra a alma e contra o mundo. Se as pirâmides do Egito tivessem realmente sido erigidas como túmulos, seriam um monumento à estupidez humana.
A idéia de que o vampiro pode assumir diversas formas animais é fruto da experiência de séculos. É claro que um corpo astral pode assumir as mais variadas formas, e o que é preciso compreender é que o vampiro é uma manifestação astral.
A ingênua crendice popular pensa que as formas que o vampiro assume são sempre desagradáveis: morcegos, lobos, etc. Mas um vampiro que assumisse formas que desagradam ou atemorizam a massa da humanidade pouco duraria; como diz o ditado; não é com vinagre que se apanha moscas! Pelo contrário, vampiros sempre assumem formas que possam fascinar as emoções de suas vítimas, buscando formar um laço de empatia com estas. Esta empatia pode ser sexual, religiosa, ou puramente afetiva; uma vez formado o laço, o vampiro pode drenar a vitalidade dos que caíram sob seu fascínio. Diremos alguns exemplos concretos para esclarecer este ponto muito importante.
Em janeiro de 1903 Aleister Crowley estava em Paris, onde encontrou um ex-colega de universidade que lhe pareceu consideravelmente perturbado. Crowley perguntou se havia algo de errado. Seu conhecido, que sabia do interesse de Crowley por ocultismo, suplicou-lhe:
-Ajude-me a livrar minha namorada de uma feiticeira!
Era um convite pouco usual e bastante interessante. Indagando a identidade da feiticeira, Crowley foi informado de que se tratava (segundo o colega) de uma vampira que possuía alguns dotes artísticos e estava modelando uma esfinge à qual tencionava imantar com energia mágicka a fim de realizar seus desejos.
Crowley nem pestanejou ao ouvir isto: na sua peregrinação através da Aurora Dourada, encontrara mentecaptos capazes de absurdos ainda maiores.
Ele tentou acalmar seu conhecido, apontando a este que uma mulher com um plano tão idiota poderia quando muito ser uma doente, mas não um perigo.
-Mas ela esta morando na casa de minha namorada-insistiu o outro e está drenando energia dela, tenho certeza! Por favor ajude-me!
Crowley concordou em ir com o outro até a residência da namorada, fazer uma visita. A moça, cuja aparência era muito sensível, recebeu-os de maneira tal que demonstrou ser ela sem dúvida encantadora e generosa.
-Meu colega disse que há uma artista de talento morando consigo -disse Crowley. Eu gostaria de conhecê-la.
A namorada, como boa inglesa (mesmo habituada em Paris), convidou imediatamente o visitante para tomar chá com ela e a sua hóspede. O namorado, que tinha um compromisso de negócios, despediu-se, deitando uma última olhadela suplicante ao Magista.
A namorada que passaremos a chamar de Srst. Q, apresentou a escultora a Crowley. A pretensa vampira era uma senhora de meia idade, embora saudável; a primeira vista era totalmente insignificante. A Srts. Q. deixou os dois à sós na sala e foi preparar o chá.
Crowley, convencido de que seu ex-colega estava obcecado por um ciúme excessivo, e de que a hóspede, que chamaremos de Sra. M., era uma pessoa totalmente inofensiva, embora talvez meio doida, viu sobre um console uma reprodução em bronze da cabeça de Balzac, escritor que ele admirava. Tomando-a nas mãos, sentou-se numa cadeira um pouco afastado da Srs. M., a qual se acomodara num sofá, e começou a contemplar a escultura.
Aos poucos ele sentiu uma estranha sensação de devaneio, muito agradável, como se estivesse sonhando acordado . Alguma coisa veluda, muito calmante, mas ao mesmo tempo erótica, moveu-se ao longo das costas da mão dele, subindo em direção ao pulso. Levantando a cabeça, ele percebeu que a Srs. M., deixara o sofá sem fazer qualquer ruído, e estava agora inclinada sobre ele: os cabelos dela estavam soltos em uma nuvem de cachos sobre os seus ombros, e era a ponta dos dedos dela que estava acariciando, o seu pulso.
A Srs. M., não era mais a mulher de meia idade, insignificante e apagada: era agora uma jovem cheia de vitalidade e extraordinária beleza.
Nesse momento Crowley percebeu que seu colega tinha razão, e que ele estava na presença de uma influência hostil de grande poder oculto. Se ele se permitisse por um instante apreciar aquela beleza, mesmo cônscio de era fictícia, todo seu poder mágicko seria neutralizado pelo vampiro: totalmente envolvido na teia magnética dela, ele se tornaria um boneco em suas mãos, um brinquedo a ser manipulado e eventualmente abandonado quando não mais interessasse à dona.
Calmamente ele se ergueu da cadeira, agindo como se nada de extraordinário tivesse ocorrido, e colocando o bronze de Bal-zac de volta sobre o console, voltou-se para a Srs. M., e, reclinando-se contra o mármore, encetou uma conversação mágicka com ela: isto é, uma conversação que superficialmente era a forma mais polida e impecável de trato social, mais que interiormente lacerava o coração maligno do vampiro, e queimava suas negras entranhas como se cada palavra fosse uma gota de ácido.
A Srs. M., cambaleou para traz, mas após seu primeiro instante de penosa surpresa voltou à carga e avançou novamente em direção a ele, mais linda, e fascinante ainda. Ela estava agora lutando por sua sobrevivência, não mais apenas pela energia vital de uma nova vítima. Se perdesse, um abismo se abriria diante dela, o abismo que toda mulher que já foi bela e cuja personalidade está apegada à carne sente diante de si quando está chegando à meia-idade: o abismo da beleza física perdida, da decrepitude, das rugas e das banhas. O cheiro de homem parecia encher-lhe o corpo Etérico inteiro de uma agilidade felina, de uma beleza irresistível. Um passo mais e ela se lançou nos braços de Crowley; gemendo uma palavra obscena, buscou colar seus lábios escarlates aos dele.
Crowley segurou-a pelos braços e, mantendo-a afastada do seu corpo, golpeou o vampiro com sua própria corrente maligna, da mesma forma como um assassino em prospecto às vezes é morto com a própria arma com que atacou sua vítima.
Uma luz azul-esverdeada pareceu brilhar em volta da cabeça da Srs. M., e então o cabelo sedoso perdeu a cor e a textura e tornou-se um cinzento sujo: a pele macia encheu-se de rugas; os olhos faiscantes se apagaram em covas remelosas. A moça de vinte anos desaparecera, e diante dele não estava mais a saudável mulher de meia-idade, e sim de uma velha de uns sessenta anos, curvada, decrépita, corrupta. Balbuciando maldições, a Srs. M. fugiu da presença do Magista.
Tendo meditado sobre o ataque, Crowley chegou a conclusão de que a Srs. M. era insignificante demais para exibir poder suficiente para quase fasciná-lo, e que ela, embora realmente um vampiro, fora utilizada por forças do mal mais poderosas que ela mesma, que a haviam tomado como foco de manifestação. Como conseqüência, ele encetou certas investigações ocultas que o levaram a descobrir uma poderosa quadrilha de falsos Esoteristas, a qual combateu durante anos até destruí-la por completo; mas a história desse combate foge ao tema deste capítulo.
Acabamos de dar um exemplo de um vampiro utilizando o fascínio sexual a fim de formular um laço magnético com sua vítima. A Srs. M. era, também um exemplo de vampiro que forma um laço de amizade com sua vítima; no caso a Srta. Q..
Após seu encontro com Crowley, a Srs. M. perdeu todo o seu poder doentio e tornou-se apenas um velhota excêntrica.
O número de casos de vampirismo com origem na devoção religiosa é praticamente incontável. O processo é muito simples: o corpo astral do vampiro assume uma forma que pareça o objeto da devoção de uma determinada pessoa, ou grupo de pessoas, e através dessa imagem astral forma um laço magnético com suas vítimas. A seguir passa a drená-las aos poucos de suas forças vitais através da devoção que elas dedicam
Este processo é impossível quando os sentimentos religiosos de uma pessoa se manifestam num nível de consciência suficientemente elevados para transcender as vibrações do corpo de desejos ( o Kama-Rupa dos hindus). Se a veneração religiosa é de um alto nível de espiritualidade, não há possibilidade de manifestação de um vampiro, porque essas entidades só existem nos planos mais grosseiros do astral. Pessoas de uma religiosidade elevada e pura, portanto, estão a salvo do vampirismo. Mas o tipo mais baixo de religiosidade está à mercê dos vampiros. Pessoas cujos sentimentos religiosos são apenas uma forma de sexualidade frustrada ou sentimentalismo doentio são as vítimas naturais deste tipo de vampirismo.
Mesmo ocultistas podem cair na armadilha. Daremos um exemplo de interesse mais imediato a candidatos sérios à iniciação Thelêmica. Existe uma operação oculta muito séria, denominada em certos sistemas de “Invocação do Sagrado Anjo Guardião”. Uma Aspirante, nossa conhecida, lançou-se à execução dessa operação mágicka sem estar suficientemente preparada para tanto. A invocação, de acordo com o método usado por ela, deveria durar seis meses; mas aproximadamente dois meses após ter iniciado a série de invocações, esta Aspirante viu aparecer em seu laboratório mágicko um homem imponente, cuja aura, segundo a descrição dela, “era tão santa que ela se sentiu compelida a ajoelhar-se diante dele.” Esta personagem declarou-lhe afavelmente que era Abramelin o Magista, e que fora designado para seu Instrutor Espiritual.
Essa Aspirante fora treinada inicialmente por um verdadeiro Adepto Thelêmico; mas com a morte desse, recusara escutar os conselhos do sucessor hierárquico do falecido. Ela acatou avidamente a visão que obtivera, e passou a seguir as “instruções” da entidade que se manifestara a ela. Como resultado, usurpou o título de iniciada da O.T.O.., abriu uma “loja” sem permissão, mandou membros dessa “loja” assaltarem a residência da viúva de seu falecido instrutor para roubar livros e manuscritos que ele, ao falecer, legara à O.T.O., e dos quais a viúva era zeladora, e atualmente está em vias de ser processada por cumplicidade em roubo, plagiarismo, e apropriação indébita.
É fato que uma das formas do “Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião” ocorre no plano relacionado ao Corpo de Desejos, e que uma forma simbólica do “Anjo” pode então aparecer ao aspirante. Mas, como está escrito, “Conhecê-los-eis pelos seus frutos”: a validade de qualquer experiência mística ou mágicka está no efeito evolutivo que produz na personalidade da pessoa que obtém a experiência.
Pouco importa, do ponto de vista da humanidade (ou do ponto de vista do Universo), se o nosso arroubo espiritual foi lindo ou gostoso. O que importa é se foi ecológico. Os iniciados definem o avanço espiritual do ser humano como maior eficiência na promoção da harmonia universal.
Se o seu arroubo não traz benefícios ao universo em que você vive, a fórmula que o compõe não é o Amor, que presupõe interação e comunicação, e sim o Ódio, que pressupõe separatividade.
Visões “místicas” ou mágickas de “santos ou santas” ocorrem constantemente em todos os sistemas religiosos. Na nomenclatura dos iogues, tais visões são formas de Dhyana, que é a experiência mística que antecede Samadhi, a qual é a verdadeira experiência mística que o iogue aspira. Em Samadhi há perfeita identidade entre você e a experiência; portanto a manifestação de forma, ou de uma Entidade separada de você mesmo, é impossível. Como diz o Bagh-i-Muattar: “Alá é o ateísta: Ele não adora Alá!”
Os cristãos que experimentam visões de “Jesus Cristo”, ou da “Virgem Maria”, por exemplo, estão experimentando projeções do plano astral da intensidade de seu próprio desejo. Se ele se apegam a tais visões, correm grande perigo de serem obcecados por entidade de uma baixa natureza. As incríveis perseguições religiosas dos cristãos uns contra os outros e contra membros de outros cultos, as espantosas crueldades da Inquisição romana e protestante, tiveram sua origem no apego por parte de crentes a visões deste tipo.
Como disse Éliphas Lévi (a encarnação anterior de Aleister Crowley) em certa ocasião a um renitente obcecado:
-Que é o que o Senhor quer ver?
-Adonai.
-O senhor sabe quem é Adonai?
-Não, mas eu quero ver ele de novo.
-Adonai é invisível.
-Eu vi ele.
-Adonai não tem forma.
-Eu toquei ele com meus dedos.
-Ele é infinito.
-Ele é quase da minha altura.
-Os profetas hebraicos diziam d’Ele que a fímbria do seu manto, do oriente ao ocidente, varre as estrelas da manhã.
-Ele estava de gravata e paletó.
-As escrituras dizem que ninguém pode vê-Lo e continuar vivo.
-A cara dele era bondosa e jovial.
Que se pode fazer num caso deste? Como podemos convencer uma alma simples de que o Jesus Cristo dos Evangelhos é apenas um símbolo do Adepto, ou de que a Virgem Universal é demasiado sublime para ser concentrada em uma simples forma humana. Principalmente quando sabemos que tanto o Cristo quanto a Virgem são arquétipos que existem em uma forma ou em outra, em todo e cada subconsciente humano.
Ainda como diz O Livro da Lei: “Não sejas animal; refina tua raptura!
O iniciado só passa além da Visão do Anjo a uma verdadeira comunhão com o Anjo quando ele percebe que é justamente a Visão que o separa d’Ele.
Qual o iogue que alcançará Samadhi enquanto se sentir satisfeito com Dhyana?
É necessário tomar o máximo cuidado com visões astrais. O plano astral é infinitamente plástico: a substância que o compõe está sempre pronta a assumir as formas do nosso desejo ou do nosso medo. Por este motivo, o Astral (como tudo mais neste mundo) é uma arma de dois gumes. Nós podemos utilizá-lo para uma auto-análise muito mais ampla que aquela que podemos obter através do mais talentoso dos psicanalistas; mas também podemos utilizá-lo para aumentar nossas ilusões e nosso autismo do ponto de nos tornarmos loucos malignos.
Tudo é função do meio em que vivemos. As almas simples que se apegam a visões astrais não poderiam ser obcecadas ao ponto de causar mal a sociedade se a tônica emocional média da sociedade fosse estatisticamente mais elevada. Isto lembra o axioma: Todo povo tem o governo que merece. Da mesma forma, toda massa humana tem a religião que merece.
Estamos no Brasil desde 1961 e.v. empregando toda a nossa força mágicka, levamos dezesseis anos para impregnar a massa brasileira com a percepção de que amor deve ser livre, e de que divórcio é um bem necessário a qualquer sociedade.
Quanto tempo mais levaremos para impressionar a mente coletiva com a necessidade de uma verdadeira democracia?
O vampirismo com origem em laços afetivos é ainda mais insidioso que o vampirismo de origem religiosa, porque a afetividade puramente humana é uma tendência mais generalizada que a religião. Uma das manifestações mais comuns deste tipo de vampirismo é encontrado na relação entre parentes, principalmente pais e filhos. A Srs. Violet M. Firth, já citada, declarou em um livro seu tratando de ataques ocultos (infelizmente já muito desatualizado): “No curso de minha experiência psicanalítica encontrei um grupo de casos em que havia uma dependência mórbida entre duas pessoas, mais freqüentemente mãe e filha, ou entre duas mulheres; em alguns casos também entre mãe e filho. Sou da opinião de que aquilo que Freud chama de “Complexo de Édipo, não é um fenômeno unilateral, e de que a “Alma” da mãe absorve a vitalidade psíquica da criança. É curioso notar quão envelhecida é sempre a fisionomia de crianças vítimas deste complexo, e como a personalidade é prematuramente amadurecida. Eu convenci vários pacientes me mostrarem fotografias suas quando crianças, e fiquei impressionada com a expressão tensa e preocupada das fisionomias infantis, como se pesassem sobre elas todos os problemas da vida adulta.”
Deve-se fazer uma ressalva neste diagnóstico da Srs. Firth; vampirismo familiar só ocorre após a puberdade. Até alcançarem a puberdade, são as crianças que sempre absorvem a vitalidade nervosa dos pais. O vampirismo materno ou paterno só pode ser diagnosticado após desenvolvimento normal dos característicos sexuais secundários de um filho ou filha.
Citaremos um exemplo de nossa própria experiência. Em uma daquelas épocas, tão comuns na vida iniciática, em que as circunstâncias materiais nos constringem, estávamos vivendo em uma pensão modesta no Rio de Janeiro onde conhecemos um casal, mãe e filho, que viviam juntos embora o filho tivesse mais de trinta anos de idade. A mãe era uma senhora calada, de aspecto amável, com os olhos muito expressivos que irradiavam uma impressão de grande afeto, não só pelo filho como pelo mundo em geral. O filho era fisicamente um homem de aspecto normal, com uma aparência e personalidade bastante positiva, bom conversador etc. Tanto quanto podíamos perceber, no contato forçado de pessoas que são vizinhas em quartos de pensão, eles viviam na maior harmonia e nos pareciam perfeitamente normais.
Mas no segundo ano de nossa estadia na pensão o filho pediu para nos falar em particular e contou-nos uma história estranha. Segundo ele, toda vez que começava a estabelecer relações sentimentais com alguma mulher, a mãe se ajoelhava a rezar constantemente diante de uma imagem, que tinha no quarto, da “Imaculada Conceição”; e mais cedo ou mais tarde alguma coisa acontecia para romper o relacionamento do filho com a “outra”.
A princípio nós presumimos que esta inusitada consulta era outra das muitas armadilhas que eram preparadas pelos órgãos da vigilância incitada contra nós pela hierarquia católica.
-Por que você está me contando tudo isso? – perguntamo-lhe.
-Não sei. É que o senhor tem um ar de pessoa que pode dar conselhos. Eu conheci outra moça recentemente, muito boa pessoa, ela gosta muito da mamãe, sabe? Mas a mamãe já está rezando….estou com medo de perder esta moça, eu gosto dela. E sabe, eu já não sou mais criança…..
Após algumas perguntas discretas, concluímos que o rapaz estava de boa fé, e fora levado a nos consultar por intuição. O histórico do caso era bastante curioso. Mãe e filho viviam juntos desde a morte do pai, quinze anos atras, e dormiam na mesma cama. A mãe nunca criticava diretamente as moças que lhe eram apresentadas pelo filho, tratando-as com a máxima cortesia; apenas, sempre que uma nova candidata aparecia, rezava diante da imagem horas a fio todo dia. Mais de uma vez o filho acordara a noite e vira a mãe de joelhos diante da imagem, rezando.
-Eu não sei o que acontece – disse ele. –Eu conheço uma moça, me entusiasmo, apresento ela à mamãe…. Passam alguns dias e meu entusiasmo vai enfraquecendo. Perco a vontade de sair com a moça, perco interesse em vê-la. É sempre assim.
-Seu problema é muito simples – se você quer realmente conservar essa moça, dê um jeito de destruir a imagem diante da qual sua mãe reza.
Ele arregalou os olhos.
-Mas eu não posso fazer isto! Mamãe tem aquela Imaculada Conceição desde o tempo de mocinha, quando era aluna do colégio de freira!
-Se você não destruir a imagem – replicamos – duvido muito que se case algum dia. Sua mãe está usando aquilo como um foco de vontade para manter você preso.
-Mas se a imagem da Imaculada tem esse poder – ele ponderou – não será porque Deus não quer que eu me case?
-Se Deus não quer que você se case, que diferença faz a imagem? Mesmo que seja destruída, você não casará nunca. Mas se, como eu penso, sua mãe está utilizando a imagem para realizar o desejo dela de manter você preso, ela está abusando de um símbolo religioso para fins materiais e egoístas.
-Mas por que ela está fazendo isto? – ele se lamentou.
Há ocasiões em que é necessário sermos diplomáticos.
-Não duvido que ela tenha a melhor das intenções – dissemos. – Você sabe, para as mães nós somos crianças a vida inteira. – Percebendo que ele ainda hesitava, acrescentamos: -Olhe, a decisão é sua. Eu não vou destruir a imagem para você. Mesmo porque, se eu destruísse a imagem, não adiantaria nada. O gesto tem que partir do enfeitiçado, ou o feitiço não se quebrará.
Novamente ele arregalou os olhos; cremos que a idéia de uma imagem católica poder ser utilizada como feitiço nunca lhe ocorrera. Após um momento, perguntou:
-Como é que eu destruo a imagem?
-Da maneira mais simples. Você tem que inutilizá-la para fins de oração. Quebre-a em pedaços e jogue-a numa lata de lixo. Mas tome cuidado para que a lata de lixo não seja uma que sua mãe tenha acesso; se ela conseguir colar os pedaços da imagem, o feitiço ficará ainda mais forte do que antes.
Dois dias depois ele nos procurou novamente e confiou-nos que retirara a imagem do quarto, quebrara-a em diversos pedaços, e a caminho do trabalho jogara os pedaços num receptáculo de lixo publico.
-E o mais esquisito – cochichou – é que a mãe não disse uma palavra quando entrou no quarto e não viu a imagem!
O namoro desse rapaz com aquela particular moça (sentimos desapontar os nossos leitores mais românticos) não durou, por motivos que explicaremos adiante; mas alguns meses depois da destruição da imagem, a mãe desenvolveu sintomas de câncer e antes do fim do ano faleceu. A corrente de forças, perdendo seu ponto de apoio, repercutira contra ela.
Esta é uma possibilidade que sempre existe em casos de vampirismo: que o vampiro, desprovido de sua presa, perca as forças e morra. Não mencionáramos a possibilidade ao nosso consulente porque tínhamos certeza de que não teria destruído a imagem em tal caso.
Mentalidades superficiais ou pessoas de moralidade pouco desenvolvida ponderarão aqui, talvez, que encorajamos um filho a praticar um matricídio mágicko. Este absolutamente não foi o caso. Se as forças vitais que a mãe estava utilizando para conservar sua vida e energia fossem naturais de seu próprio organismo, a destruição da imagem não teria lhe causado qualquer dano físico. Nenhum ser humano tem o direito de se conservar vivo à custa do prana dos seus semelhantes. Para os iniciados, a morte é uma etapa da vida.
Já mencionamos que o vampirismo é contagioso: o namoro desse rapaz com a moça que o levou a destruir a imagem não continuou porque (conforme pudemos averiguar) ele começou a demonstrar para com ela o mesmo tipo de ciúmes doentio que a mãe tivera para com ele.
“Dize-me com quem andas, e te direis quem és”, é um desses truísmos que todo mundo repete sem lhes prestar atenção; no entanto é um formidável aviso no que se refere à Magick e ao misticismo. Uma pessoa vampirizada, perdendo sua energia, tende a absorver energia dos outros, e é encorajada a assim fazer pelo próprio vampiro, que deseja aumentar suas fontes de alimentação. Aprendendo os truques do vampiro à custa de sua própria experiência como vítima, ela começa ( na maioria das vezes sem se tornar cônscia do fato) a utilizar as mesmas técnicas que seu algoz. Usando ainda outro truísmo, “a prática leva a perfeição”: em muito menos tempo do que julgaríamos possível, a vítima se torna outro malfeitor.
George Cecil Jones, um dos dois únicos membros da Aurora Dourada, além de Aleister Crowley, que foram capazes de alcançar o Adeptado legítimo, (conhecido na AA pelo seu Nome Mágicko, D.D.S.) teve em certa ocasião um experiência curiosa. A mesma Srs. Firth, Dion Fortune, pediu sua ajuda num caso raro de perturbação mental que viera a seu conhecimento. (A Srs. Firth foi uma das primeiras mulheres psicanalistas da Inglaterra.)
Uma colega da Srs. Firth aceitara como paciente um certo jovem de família ilustre, o qual exibia sintomas periódicos muito semelhantes a ataques de epilepsia; e para poder fiscalizar o progresso de seu paciente com mais cuidado, consentira em hospedá-lo num apartamento que ela dividia com outra estudante, não de psicanálise.
Um fenômeno muito estranho começou a ocorrer assim que o paciente foi viver no apartamento: toda noite, quase à mesma hora, os cães da vizinhança começavam a latir e uivar furiosamente, e no mesmo instante uma janela de sacada, que dava para uma varanda, se abria e uma corrente de ar frio percorria o apartamento. Imediatamente após, o paciente hospedado entrava em convulsões, e a seguir sofria um desmaio prolongado.
Embora a janela de sacada fosse fechada à chave, e até barricada, assim mesmo se abria; e foi este fato inusitado que levou a colega de Dion Fortune a recorrer a ela, que sabia ser interessada em casos desta natureza.
A Srs. Firth indagou sobre os antecedentes do paciente, e ficou sabendo que este tinha um primo em segundo grau, também de família nobre, o qual tinha sido descoberto em flagrante na França, durante a guerra, praticando necrofilia com cadáver de um alemão. Graças à influência de sua família o jovem necrofílíaco não fora mandado para uma prisão militar, mas sim colocado sob responsabilidade de sua família como um caso de loucura. O jovem exibia sintomas semelhantes ao do primo, com ataques periódicos seguidos de prolongada coma, e foi posto sob os cuidados de um enfermeiro. Mas o enfermeiro, como todo mundo, tirou férias; e nessa ocasião o doente foi colocado sob os cuidados de seu primo.
Acontece que o primo também tinha tendências homossexuais, e o doente incitou-o à intimidade. Em certa ocasião, o necrofilíaco mordeu seu parceiro no pescoço durante o ato, com tanta força que chegou a tirar sangue.
Foi após esta particular ocasião que o primo começou a exibir os mesmos sintomas de epilepsia que o doente, o que levou a sua família a colocá-lo sob os cuidados da colega de Dion Fortune.
A Srs. Firth visitou o apartamento e examinou o jovem. Constatou que estava anêmico, e curiosamente indiferente aos seu próprio estado de saúde. Era como se estivesse resignado a morrer.
Aproximadamente às nove horas da noite, o mesmo fenômeno curioso se repetiu; os cães da vizinhança começaram a latir e a uivar, e a janela da sacada, embora barricada por uma pesada poltrona, abriu-se e um lufada de ar frio invadiu os aposentos. Ao chegar ao quarto do rapaz, este soltou um grito, curiosa mescla de prazer e medo, e após agitar-se de um lado para outro na cama, desfaleceu.
-Isto não é epilepsia – a Srs. Firth disse a sua colega – mas algo bem diverso.
-Você pode fazer alguma coisa? – perguntou a outra.
-Eu talvez não, mas conheço alguém que pode.
A Srs. Firth foi procurar George Cecil Jones, sob cuja supervisão ela se colocara após chegar a conclusão de que os Mathers haviam perdido contato com os Chefes Secretos. O adepto ouviu com atenção os sintomas do caso e finalmente declarou que gostaria de estar presente durante um ataque de nervos do paciente da sua colega.
-Eles sempre ocorrem mais ou menos à mesma hora – disse Dion Fortune, ou seja por volta das nove e meia, e dez da noite.
-A que hora, em geral, o primo dele vai dormir? – perguntou Jones.
A idéia não havia ocorrido a Dion Fortune, mas ela se informou por telefone, e ficou sabendo que o primo em geral se recolhia naquele mesmo horário, ocasião que seu enfermeiro se retirava para dormir.
-Sem dúvida nenhuma – disse Jones – eu gostaria de estar presente durante o próximo ataque.
Jones um farmacêutico conceituado e muito bem casado, explicou a esposa que provavelmente passaria a noite fora; e as oito estava no apartamento da colega de D. Fortune.
As nove e meia os cães começaram a latir; a janela de sacada abriu-se suavemente; uma corrente de ar frio percorreu a sala.
-Uma entidade muito desagradável acaba de entrar neste apartamento – declarou Jones. Está ali no canto da sala.
-Eu não vejo nada – declarou a colega de D. Fortune.
-Nem eu – confessou esta.
-Diminuam as luzes – disse o Adepto.
Duas lâmpadas foram apagadas, e as mulheres puderam ver uma espécie de brilho muito fosco num canto indicado por ele.
-Ponham a mão naquilo – disse Jones.
Elas assim fizeram e experimentaram um leve formigamento, semelhante àquele produzido por uma cãibra num membro dormente.
Jones dirigiu-se a janela de sacada e, mergulhando os dedos num vasilhame de água com sabão que preparara de antemão, pronunciou certas palavras e selou a abertura de toda sua extensão. No centro do piso ele traçou um pentagrama apontando para dentro, seguindo uma forma particular no traçado, e pronunciou um Nome em voz baixa.
-Está saindo da sala! – exclamou Dion Fortune, seguindo o clarão fosco com os olhos.
-Não conseguirá escapar – disse o Adepto. –Todas as vias de acesso estão seladas. Deixei a janela por último exatamente para que a entidade pudesse entrar.
-Como vamos destruí-la? – perguntou D. Fortune.
-Não vamos destruí-la – disse Jones. – Eu vou absorvê-la.
O brilho fosco – a única coisa que as duas mulheres podiam ver com os olhos físicos – recuou passo a passo através do apartamento inteiro, movimentando-se até as portas e janelas apenas para fugir delas. No quarto do paciente, este, de olhos arregalados, acompanhou a entrada de três pessoas (entre elas um quase desconhecido que viera previamente a seu quarto apenas para lhe molhar e fazer gestos Qabalísticos no ar) as quais pareciam saguaro alguma coisa que apenas um deles podia “ver”, e a subsequente saída do trio, sempre em perseguição de alguma coisa impalpável. A Srs. Firth comentou mais tarde que a expressão do jovem tinha sido muito engraçada, e que era pena que na ocasião ela não tivesse tido nem tempo nem disposição para rir.
A entidade finalmente foi encurralada no banheiro do apartamento, cuja basculante também havia sido selada por Jones; e quando tentou sair novamente, o Adepto colocou-se em frente à porta, recomendando às duas mulheres que ficassem de fora. Passo a passo, Jones avançou para o “brilho fosco” e finalmente “entrou” nele.
Dion Fortune, numa versão altamente glamurizada deste incidente, declarou que, ao terminar de absorver o vampiro, Jones caiu desfalecido. Tal não aconteceu: o Adepto ficou apenas um pouco tonto, e após sentar-se e tomar um dedo de conhaque recuperou-se.
O resultado desta aventura um pouco sensacional foi que não só o paciente da colega da Srs. Firth como o seu primo pararam de sofrer “ataques epiléticos”e recuperaram a saúde. O ex-combatente, entretanto, continuou a ser homossexual, e durante o resto da vida se tornou célebre na alta sociedade britânica por seus excessos. Estes, porém, foram sempre de ordem mundana, sem quaisquer sintomas de vampirismo ou outros fenômenos ocultos.
O paciente da colega da Srs. Firth confessou à sua psicanalista que sempre sentira que estava sendo atacado por algum “fantasma” quando tinha a crise; mas não ousara dizer isto a ninguém, por medo de ser considerado louco e internado num manicômio.
Jones, quando interrogado por Dion Fortune quanto à origem do vampiro, declarou que não fora um ser humano encarnado, nem um corpo astral habitado por um ser humano, mas apenas um cascão abandonado por alguma pessoa de hábitos parasitas (como um gigolô, um proxeneta, ou certos tipos de padres católicos e mulheres casadas), o qual fora atraído ao campo de batalha pelo sangue derramado; talvez mesmo o corpo astral do morto com o qual o primo mantivera relações anormais. A origem da entidade pouco importava: nas circunstâncias, ela pudera formar um laço magnético com o soldado; e mais tarde fizera o mesmo com o primo deste, no momento em que a mordida no pescoço derramara sangue.
Não deve ser concluído daí que uma mordida no pescoço ou em qualquer outra parte do corpo, com derrame de sangue, é indispensável à manifestação de um vampiro, ou resulta fatalmente em vampirismo! O fenômeno é de natureza eletromagnética, ou etérica, para usar a nomenclatura criada pelos teosofistas para traduzir os termos hindus.
A manifestação de vampiros pode ocorrer sem qualquer marca aparente no corpo físico.
Em casos, porém de anemia crescente e inexplicável pela medicina oficial, é possível que haja marcas materiais, pois a entidade responsável existe no limiar do mundo físico, como aquela do caso que acabamos de relatar. Mas tais marcas nunca são tão grosseiras como as tradicionais picadas gêmeas do romance de Bram Stoker ou dos filmes de vampiro! Quando suspeitamos que a emaciação orgânica é causada por um vampiro, devemos examinar a pele do paciente com uma lente de aumento. A lente tornará visível diminutos furos semelhantes a picadas de insetos. Segundo Dion Fortune esses furos se concentram mais no pescoço, principalmente debaixo das orelhas, em volta da ponta dos artelhos, ou nos seios. Mas Dion Fortune viveu numa época muito pudica, e não mencionou que tais furos também devem ser procurados na parte interna das coxas, entre as nádegas, e na virilha ou no púbis. Caso sejam notados no corpo de pessoas cujo Meio-Ambiente ou asseio pessoal invalide a possibilidade de serem causados por mosquitos, pulgas e percevejos, então está na hora de considerar a possibilidade de um vampiro, o qual pode, inclusive, estar encarnado e bem vivo, e ir a praia em pleno sol aos domingos!
Talvez a maior fascinação da obra do romancista inglês que nunca mais escreveu coisa alguma tão bem sucedida, seja a riqueza de dados folclóricos do interior europeu sobre o vampiro. Os fatos de Stoker quanto ao vampiro, sua conduta, sua manifestação, são extremamente bem descritos.
A tradição de que o alho afugenta o vampiro; de que este não pode entrar numa residência sem convite de alguém que lá se encontre; de que vampirismo é infeccioso; de que vampiro pode assumir diversas formas animais; de que a única maneira de matar um vampiro é destruir o corpo, ou pelo menos inutilizá-lo para as funções biológicas; tudo isto está fundamentado no folclore de diversas nações da Europa.
Até que ponto se trata de fatos, no senso científico da palavra, e até que ponto se trata de superstição? Vejamos, ponto por ponto.
Que o alho é repelente para certos tipo de entidades do mundo sutil é um fato conhecido de ocultistas; mas não decorre disto, absolutamente, que deva ser repugnante aos vampiros. Suponhamos, por exemplo, que o vampiro seja de origem italiana; poderíamos sequer pensar que o alho lhe seja repelente, quando a cozinha de seu país usa tão liberadamente este tempero?
Não se deve julgar que o parágrafo acima foi escrito como pilhéria. O condicionamento cultural de um indivíduo é sempre um fator em sua forma de manifestação em qualquer plano, mesmo no caso de um vampiro. Um cineasta de talento, Roman Polanski, recentemente fez um filme sobre vampiros. Uma das cenas, uma donzela amedrontada ergue um crucifixo em frente do vampiro. Este ri deliciado e lhe diz: “Você está com o vampiro errado!” este vampiro do filme, era de origem judaica.
Embora a cena seja uma pilhéria, o filme é uma comédia de humor negro. O cineasta tocou num ponto de grande importância oculta: os símbolos de uma determinada religião só amedrontam àqueles que acreditam na vaidade daquela religião. Portanto, é totalmente inútil tentar usar símbolos cristãos para afugentar entidades que pertencem a outras correntes religiosas, principalmente os judeus, que estão cansados de saber que nunca existiu nenhum Jesus Cristo, e que a carreira inteira do catolicismo romano está baseada numa hábil vigarice.
Quanto a impossibilidade de um vampiro penetrar em uma residência sem o consentimento de alguém que lá resida, isto, como já dissemos anteriormente, é uma superstição suja base encontra-se no fato de que ninguém pode ser magicamente atacado sem que haja um ponto de afinidade entre sua estrutura anímica e a entidade atacante. Mas é claro que um vampiro, ou qualquer outro tipo de entidade, pode penetrar em qualquer ambiente que não esteja magicamente defendido. Para a entidade permanecer ali, entretanto, é necessário que encontre um ponto de apoio, uma afinidade, e a superstição quanto à entrada do vampiro está baseada nisto.
De todas as superstições em torno do vampiro, só três são importantes do ponto de vista científico:
1 – A idéia de que o vampiro pode assumir diversas formas animais.
2 – A idéia de que é necessário destruir o corpo físico do vampiro, ou inutilizá-lo, para as possibilidade de funções fisiológicas.
3 – A idéia de que o vampiro é contagioso.
A importância destas superstições consiste em que elas não são superstições, mas sim fatos verificáveis pelo trabalho oculto.
Antes de entrarmos em detalhes quanto aos três pontos acima seria conveniente observar que o vampirismo é um fenômeno que se manifesta com diversos graus de gravidade. Todos estamos familiarizados com a experiência de que a aura de determinadas pessoas nos exaure de energia; e diga-se de passagem que mesmo esta ocorrência tão corriqueira não é invariável. Por exemplo, uma pessoa nossa amiga pode, em determinada ocasião, estar deprimida ou magicamente enfraquecida, e em tal ocasião tenderá a absorver nossa energia enquanto em outra ocasião talvez se dê justamente o contrário, e nós absorvemos a sua. Este tipo de intercâmbio magnético deve ser considerado normal. Faz parte das flutuações normais das forças vitais da sociedade humana.
Também, uma pessoa que sofreu um esgotamento nervoso, ou que está se recuperando de uma grave moléstia pode ocasionalmente estar tão enfraquecida que absorve o prana de outras pessoas, como de animais e plantas. (As plantas principalmente, são extremamente sensitivas ao intercâmbio da energia vital, e tanto são capazes de fornecê-la quanto de absorvê-la. Daí dependendo de nosso temperamento, a influência vitalizante de florestas e bosques, ou a influência deprimente das regiões pantanosas e insalubres.)
Tais, casos, se bem que tecnicamente caiam na definição de vampirismo, não chegam a ser patológicos no sentido exato da palavra. O verdadeiro vampirismo consiste na absorção proposital de energia vital de seres humanos para prolongar a existência de entidades que, sem este parasitismo, se dissolveriam e morreriam como parte do processo evolutivo normal.
É por este motivo que é conveniente destruir o corpo de um vampiro. O Cadáver de uma alma apegada à terra (e isto é essencialmente um vampiro) torna-se um foco magnético, uma espécie de base de operações da entidade astral. Por estranho que pareça aos profanos, não é o corpo astral que é a base de manifestação do corpo físico, mas justamente o contrário. O corpo astral é como um carro, e o corpo físico a sua garagem. Por isto, o vampiro sempre busca ficar em contato com o corpo físico; e se possível, evitar a decomposição deste.
Os antigos egípcios sabedores desta relação íntima entre o astral e o material, procuravam preservar o mais possível o cadáver dos mortos, principalmente dos sacerdotes e nobres.
A mumificação tinha como finalidade preservar, ou auxiliar a preservar, a integridade do corpo astral dos falecidos, durante o maior espaço de tempo possível.
Não temos aqui espaço para entrar a fundo neste assunto; e o propósito dos egípcios não era absolutamente encorajar o vampirismo. Entretanto, as lendas dos vampiros estão relacionadas com casos lamentáveis de baixos iniciados egípcios que, uma vez esgotados os recurso naturais de preservação do astral, laçavam mão das energias vitais de homens e mulheres vivos.
A idéia, portanto, que a destruição do corpo do vampiro é uma maneira eficaz de destruir seus poderes não deixa de ter sua validade; mas é tolice acreditar que a destruição do cadáver é imediatamente seguida pela morte do vampiro. O corpo astral sobreviverá, embora sem a base material que o estabilizava. Entretanto, uma vez esgota a sua carga de energia, ele se dissipará lentamente na Segunda Morte. É este o destino que apavora a entidade que se manifesta como o vampiro, e se puder adiá-lo através da absorção da energia vital de outros seres humanos, ela assim fará.
Do que foi escrito acima deduz-se que é mais seguro, diremos até mais higiênico, acelerar a dissolução do corpo físico dos mortos do que preservá-lo. O hábito de enterrar cadáveres dentro de caixotes (e freqüentemente embalsamados!) é uma estupidez mesmo do ponto de vista da ecologia. A carne em decomposição se subdivide em diversas subestruturas organo-químicas que (por exemplo) tornam o solo mais fecundado e mais propício a vegetação. Os cadáveres deveriam ser enterrados nos campos de plantio, ou em jardins. Poderiam ser primeiramente legados a hospitais, para fins científicos ou de transplantes de órgãos; e após assim utilizados para auxiliar os vivos, poderiam ser convertidos em proteínas e adubo. A reciclagem é um processo normal da natureza, e um cemitério é um crime contra a alma e contra o mundo. Se as pirâmides do Egito tivessem realmente sido erigidas como túmulos, seriam um monumento à estupidez humana.
A idéia de que o vampiro pode assumir diversas formas animais é fruto da experiência de séculos. É claro que um corpo astral pode assumir as mais variadas formas, e o que é preciso compreender é que o vampiro é uma manifestação astral.
A ingênua crendice popular pensa que as formas que o vampiro assume são sempre desagradáveis: morcegos, lobos, etc. Mas um vampiro que assumisse formas que desagradam ou atemorizam a massa da humanidade pouco duraria; como diz o ditado; não é com vinagre que se apanha moscas! Pelo contrário, vampiros sempre assumem formas que possam fascinar as emoções de suas vítimas, buscando formar um laço de empatia com estas. Esta empatia pode ser sexual, religiosa, ou puramente afetiva; uma vez formado o laço, o vampiro pode drenar a vitalidade dos que caíram sob seu fascínio. Diremos alguns exemplos concretos para esclarecer este ponto muito importante.
Em janeiro de 1903 Aleister Crowley estava em Paris, onde encontrou um ex-colega de universidade que lhe pareceu consideravelmente perturbado. Crowley perguntou se havia algo de errado. Seu conhecido, que sabia do interesse de Crowley por ocultismo, suplicou-lhe:
-Ajude-me a livrar minha namorada de uma feiticeira!
Era um convite pouco usual e bastante interessante. Indagando a identidade da feiticeira, Crowley foi informado de que se tratava (segundo o colega) de uma vampira que possuía alguns dotes artísticos e estava modelando uma esfinge à qual tencionava imantar com energia mágicka a fim de realizar seus desejos.
Crowley nem pestanejou ao ouvir isto: na sua peregrinação através da Aurora Dourada, encontrara mentecaptos capazes de absurdos ainda maiores.
Ele tentou acalmar seu conhecido, apontando a este que uma mulher com um plano tão idiota poderia quando muito ser uma doente, mas não um perigo.
-Mas ela esta morando na casa de minha namorada-insistiu o outro e está drenando energia dela, tenho certeza! Por favor ajude-me!
Crowley concordou em ir com o outro até a residência da namorada, fazer uma visita. A moça, cuja aparência era muito sensível, recebeu-os de maneira tal que demonstrou ser ela sem dúvida encantadora e generosa.
-Meu colega disse que há uma artista de talento morando consigo -disse Crowley. Eu gostaria de conhecê-la.
A namorada, como boa inglesa (mesmo habituada em Paris), convidou imediatamente o visitante para tomar chá com ela e a sua hóspede. O namorado, que tinha um compromisso de negócios, despediu-se, deitando uma última olhadela suplicante ao Magista.
A namorada que passaremos a chamar de Srst. Q, apresentou a escultora a Crowley. A pretensa vampira era uma senhora de meia idade, embora saudável; a primeira vista era totalmente insignificante. A Srts. Q. deixou os dois à sós na sala e foi preparar o chá.
Crowley, convencido de que seu ex-colega estava obcecado por um ciúme excessivo, e de que a hóspede, que chamaremos de Sra. M., era uma pessoa totalmente inofensiva, embora talvez meio doida, viu sobre um console uma reprodução em bronze da cabeça de Balzac, escritor que ele admirava. Tomando-a nas mãos, sentou-se numa cadeira um pouco afastado da Srs. M., a qual se acomodara num sofá, e começou a contemplar a escultura.
Aos poucos ele sentiu uma estranha sensação de devaneio, muito agradável, como se estivesse sonhando acordado . Alguma coisa veluda, muito calmante, mas ao mesmo tempo erótica, moveu-se ao longo das costas da mão dele, subindo em direção ao pulso. Levantando a cabeça, ele percebeu que a Srs. M., deixara o sofá sem fazer qualquer ruído, e estava agora inclinada sobre ele: os cabelos dela estavam soltos em uma nuvem de cachos sobre os seus ombros, e era a ponta dos dedos dela que estava acariciando, o seu pulso.
A Srs. M., não era mais a mulher de meia idade, insignificante e apagada: era agora uma jovem cheia de vitalidade e extraordinária beleza.
Nesse momento Crowley percebeu que seu colega tinha razão, e que ele estava na presença de uma influência hostil de grande poder oculto. Se ele se permitisse por um instante apreciar aquela beleza, mesmo cônscio de era fictícia, todo seu poder mágicko seria neutralizado pelo vampiro: totalmente envolvido na teia magnética dela, ele se tornaria um boneco em suas mãos, um brinquedo a ser manipulado e eventualmente abandonado quando não mais interessasse à dona.
Calmamente ele se ergueu da cadeira, agindo como se nada de extraordinário tivesse ocorrido, e colocando o bronze de Bal-zac de volta sobre o console, voltou-se para a Srs. M., e, reclinando-se contra o mármore, encetou uma conversação mágicka com ela: isto é, uma conversação que superficialmente era a forma mais polida e impecável de trato social, mais que interiormente lacerava o coração maligno do vampiro, e queimava suas negras entranhas como se cada palavra fosse uma gota de ácido.
A Srs. M., cambaleou para traz, mas após seu primeiro instante de penosa surpresa voltou à carga e avançou novamente em direção a ele, mais linda, e fascinante ainda. Ela estava agora lutando por sua sobrevivência, não mais apenas pela energia vital de uma nova vítima. Se perdesse, um abismo se abriria diante dela, o abismo que toda mulher que já foi bela e cuja personalidade está apegada à carne sente diante de si quando está chegando à meia-idade: o abismo da beleza física perdida, da decrepitude, das rugas e das banhas. O cheiro de homem parecia encher-lhe o corpo Etérico inteiro de uma agilidade felina, de uma beleza irresistível. Um passo mais e ela se lançou nos braços de Crowley; gemendo uma palavra obscena, buscou colar seus lábios escarlates aos dele.
Crowley segurou-a pelos braços e, mantendo-a afastada do seu corpo, golpeou o vampiro com sua própria corrente maligna, da mesma forma como um assassino em prospecto às vezes é morto com a própria arma com que atacou sua vítima.
Uma luz azul-esverdeada pareceu brilhar em volta da cabeça da Srs. M., e então o cabelo sedoso perdeu a cor e a textura e tornou-se um cinzento sujo: a pele macia encheu-se de rugas; os olhos faiscantes se apagaram em covas remelosas. A moça de vinte anos desaparecera, e diante dele não estava mais a saudável mulher de meia-idade, e sim de uma velha de uns sessenta anos, curvada, decrépita, corrupta. Balbuciando maldições, a Srs. M. fugiu da presença do Magista.
Tendo meditado sobre o ataque, Crowley chegou a conclusão de que a Srs. M. era insignificante demais para exibir poder suficiente para quase fasciná-lo, e que ela, embora realmente um vampiro, fora utilizada por forças do mal mais poderosas que ela mesma, que a haviam tomado como foco de manifestação. Como conseqüência, ele encetou certas investigações ocultas que o levaram a descobrir uma poderosa quadrilha de falsos Esoteristas, a qual combateu durante anos até destruí-la por completo; mas a história desse combate foge ao tema deste capítulo.
Acabamos de dar um exemplo de um vampiro utilizando o fascínio sexual a fim de formular um laço magnético com sua vítima. A Srs. M. era, também um exemplo de vampiro que forma um laço de amizade com sua vítima; no caso a Srta. Q..
Após seu encontro com Crowley, a Srs. M. perdeu todo o seu poder doentio e tornou-se apenas um velhota excêntrica.
O número de casos de vampirismo com origem na devoção religiosa é praticamente incontável. O processo é muito simples: o corpo astral do vampiro assume uma forma que pareça o objeto da devoção de uma determinada pessoa, ou grupo de pessoas, e através dessa imagem astral forma um laço magnético com suas vítimas. A seguir passa a drená-las aos poucos de suas forças vitais através da devoção que elas dedicam
Este processo é impossível quando os sentimentos religiosos de uma pessoa se manifestam num nível de consciência suficientemente elevados para transcender as vibrações do corpo de desejos ( o Kama-Rupa dos hindus). Se a veneração religiosa é de um alto nível de espiritualidade, não há possibilidade de manifestação de um vampiro, porque essas entidades só existem nos planos mais grosseiros do astral. Pessoas de uma religiosidade elevada e pura, portanto, estão a salvo do vampirismo. Mas o tipo mais baixo de religiosidade está à mercê dos vampiros. Pessoas cujos sentimentos religiosos são apenas uma forma de sexualidade frustrada ou sentimentalismo doentio são as vítimas naturais deste tipo de vampirismo.
Mesmo ocultistas podem cair na armadilha. Daremos um exemplo de interesse mais imediato a candidatos sérios à iniciação Thelêmica. Existe uma operação oculta muito séria, denominada em certos sistemas de “Invocação do Sagrado Anjo Guardião”. Uma Aspirante, nossa conhecida, lançou-se à execução dessa operação mágicka sem estar suficientemente preparada para tanto. A invocação, de acordo com o método usado por ela, deveria durar seis meses; mas aproximadamente dois meses após ter iniciado a série de invocações, esta Aspirante viu aparecer em seu laboratório mágicko um homem imponente, cuja aura, segundo a descrição dela, “era tão santa que ela se sentiu compelida a ajoelhar-se diante dele.” Esta personagem declarou-lhe afavelmente que era Abramelin o Magista, e que fora designado para seu Instrutor Espiritual.
Essa Aspirante fora treinada inicialmente por um verdadeiro Adepto Thelêmico; mas com a morte desse, recusara escutar os conselhos do sucessor hierárquico do falecido. Ela acatou avidamente a visão que obtivera, e passou a seguir as “instruções” da entidade que se manifestara a ela. Como resultado, usurpou o título de iniciada da O.T.O.., abriu uma “loja” sem permissão, mandou membros dessa “loja” assaltarem a residência da viúva de seu falecido instrutor para roubar livros e manuscritos que ele, ao falecer, legara à O.T.O., e dos quais a viúva era zeladora, e atualmente está em vias de ser processada por cumplicidade em roubo, plagiarismo, e apropriação indébita.
É fato que uma das formas do “Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião” ocorre no plano relacionado ao Corpo de Desejos, e que uma forma simbólica do “Anjo” pode então aparecer ao aspirante. Mas, como está escrito, “Conhecê-los-eis pelos seus frutos”: a validade de qualquer experiência mística ou mágicka está no efeito evolutivo que produz na personalidade da pessoa que obtém a experiência.
Pouco importa, do ponto de vista da humanidade (ou do ponto de vista do Universo), se o nosso arroubo espiritual foi lindo ou gostoso. O que importa é se foi ecológico. Os iniciados definem o avanço espiritual do ser humano como maior eficiência na promoção da harmonia universal.
Se o seu arroubo não traz benefícios ao universo em que você vive, a fórmula que o compõe não é o Amor, que presupõe interação e comunicação, e sim o Ódio, que pressupõe separatividade.
Visões “místicas” ou mágickas de “santos ou santas” ocorrem constantemente em todos os sistemas religiosos. Na nomenclatura dos iogues, tais visões são formas de Dhyana, que é a experiência mística que antecede Samadhi, a qual é a verdadeira experiência mística que o iogue aspira. Em Samadhi há perfeita identidade entre você e a experiência; portanto a manifestação de forma, ou de uma Entidade separada de você mesmo, é impossível. Como diz o Bagh-i-Muattar: “Alá é o ateísta: Ele não adora Alá!”
Os cristãos que experimentam visões de “Jesus Cristo”, ou da “Virgem Maria”, por exemplo, estão experimentando projeções do plano astral da intensidade de seu próprio desejo. Se ele se apegam a tais visões, correm grande perigo de serem obcecados por entidade de uma baixa natureza. As incríveis perseguições religiosas dos cristãos uns contra os outros e contra membros de outros cultos, as espantosas crueldades da Inquisição romana e protestante, tiveram sua origem no apego por parte de crentes a visões deste tipo.
Como disse Éliphas Lévi (a encarnação anterior de Aleister Crowley) em certa ocasião a um renitente obcecado:
-Que é o que o Senhor quer ver?
-Adonai.
-O senhor sabe quem é Adonai?
-Não, mas eu quero ver ele de novo.
-Adonai é invisível.
-Eu vi ele.
-Adonai não tem forma.
-Eu toquei ele com meus dedos.
-Ele é infinito.
-Ele é quase da minha altura.
-Os profetas hebraicos diziam d’Ele que a fímbria do seu manto, do oriente ao ocidente, varre as estrelas da manhã.
-Ele estava de gravata e paletó.
-As escrituras dizem que ninguém pode vê-Lo e continuar vivo.
-A cara dele era bondosa e jovial.
Que se pode fazer num caso deste? Como podemos convencer uma alma simples de que o Jesus Cristo dos Evangelhos é apenas um símbolo do Adepto, ou de que a Virgem Universal é demasiado sublime para ser concentrada em uma simples forma humana. Principalmente quando sabemos que tanto o Cristo quanto a Virgem são arquétipos que existem em uma forma ou em outra, em todo e cada subconsciente humano.
Ainda como diz O Livro da Lei: “Não sejas animal; refina tua raptura!
O iniciado só passa além da Visão do Anjo a uma verdadeira comunhão com o Anjo quando ele percebe que é justamente a Visão que o separa d’Ele.
Qual o iogue que alcançará Samadhi enquanto se sentir satisfeito com Dhyana?
É necessário tomar o máximo cuidado com visões astrais. O plano astral é infinitamente plástico: a substância que o compõe está sempre pronta a assumir as formas do nosso desejo ou do nosso medo. Por este motivo, o Astral (como tudo mais neste mundo) é uma arma de dois gumes. Nós podemos utilizá-lo para uma auto-análise muito mais ampla que aquela que podemos obter através do mais talentoso dos psicanalistas; mas também podemos utilizá-lo para aumentar nossas ilusões e nosso autismo do ponto de nos tornarmos loucos malignos.
Tudo é função do meio em que vivemos. As almas simples que se apegam a visões astrais não poderiam ser obcecadas ao ponto de causar mal a sociedade se a tônica emocional média da sociedade fosse estatisticamente mais elevada. Isto lembra o axioma: Todo povo tem o governo que merece. Da mesma forma, toda massa humana tem a religião que merece.
Estamos no Brasil desde 1961 e.v. empregando toda a nossa força mágicka, levamos dezesseis anos para impregnar a massa brasileira com a percepção de que amor deve ser livre, e de que divórcio é um bem necessário a qualquer sociedade.
Quanto tempo mais levaremos para impressionar a mente coletiva com a necessidade de uma verdadeira democracia?
O vampirismo com origem em laços afetivos é ainda mais insidioso que o vampirismo de origem religiosa, porque a afetividade puramente humana é uma tendência mais generalizada que a religião. Uma das manifestações mais comuns deste tipo de vampirismo é encontrado na relação entre parentes, principalmente pais e filhos. A Srs. Violet M. Firth, já citada, declarou em um livro seu tratando de ataques ocultos (infelizmente já muito desatualizado): “No curso de minha experiência psicanalítica encontrei um grupo de casos em que havia uma dependência mórbida entre duas pessoas, mais freqüentemente mãe e filha, ou entre duas mulheres; em alguns casos também entre mãe e filho. Sou da opinião de que aquilo que Freud chama de “Complexo de Édipo, não é um fenômeno unilateral, e de que a “Alma” da mãe absorve a vitalidade psíquica da criança. É curioso notar quão envelhecida é sempre a fisionomia de crianças vítimas deste complexo, e como a personalidade é prematuramente amadurecida. Eu convenci vários pacientes me mostrarem fotografias suas quando crianças, e fiquei impressionada com a expressão tensa e preocupada das fisionomias infantis, como se pesassem sobre elas todos os problemas da vida adulta.”
Deve-se fazer uma ressalva neste diagnóstico da Srs. Firth; vampirismo familiar só ocorre após a puberdade. Até alcançarem a puberdade, são as crianças que sempre absorvem a vitalidade nervosa dos pais. O vampirismo materno ou paterno só pode ser diagnosticado após desenvolvimento normal dos característicos sexuais secundários de um filho ou filha.
Citaremos um exemplo de nossa própria experiência. Em uma daquelas épocas, tão comuns na vida iniciática, em que as circunstâncias materiais nos constringem, estávamos vivendo em uma pensão modesta no Rio de Janeiro onde conhecemos um casal, mãe e filho, que viviam juntos embora o filho tivesse mais de trinta anos de idade. A mãe era uma senhora calada, de aspecto amável, com os olhos muito expressivos que irradiavam uma impressão de grande afeto, não só pelo filho como pelo mundo em geral. O filho era fisicamente um homem de aspecto normal, com uma aparência e personalidade bastante positiva, bom conversador etc. Tanto quanto podíamos perceber, no contato forçado de pessoas que são vizinhas em quartos de pensão, eles viviam na maior harmonia e nos pareciam perfeitamente normais.
Mas no segundo ano de nossa estadia na pensão o filho pediu para nos falar em particular e contou-nos uma história estranha. Segundo ele, toda vez que começava a estabelecer relações sentimentais com alguma mulher, a mãe se ajoelhava a rezar constantemente diante de uma imagem, que tinha no quarto, da “Imaculada Conceição”; e mais cedo ou mais tarde alguma coisa acontecia para romper o relacionamento do filho com a “outra”.
A princípio nós presumimos que esta inusitada consulta era outra das muitas armadilhas que eram preparadas pelos órgãos da vigilância incitada contra nós pela hierarquia católica.
-Por que você está me contando tudo isso? – perguntamo-lhe.
-Não sei. É que o senhor tem um ar de pessoa que pode dar conselhos. Eu conheci outra moça recentemente, muito boa pessoa, ela gosta muito da mamãe, sabe? Mas a mamãe já está rezando….estou com medo de perder esta moça, eu gosto dela. E sabe, eu já não sou mais criança…..
Após algumas perguntas discretas, concluímos que o rapaz estava de boa fé, e fora levado a nos consultar por intuição. O histórico do caso era bastante curioso. Mãe e filho viviam juntos desde a morte do pai, quinze anos atras, e dormiam na mesma cama. A mãe nunca criticava diretamente as moças que lhe eram apresentadas pelo filho, tratando-as com a máxima cortesia; apenas, sempre que uma nova candidata aparecia, rezava diante da imagem horas a fio todo dia. Mais de uma vez o filho acordara a noite e vira a mãe de joelhos diante da imagem, rezando.
-Eu não sei o que acontece – disse ele. –Eu conheço uma moça, me entusiasmo, apresento ela à mamãe…. Passam alguns dias e meu entusiasmo vai enfraquecendo. Perco a vontade de sair com a moça, perco interesse em vê-la. É sempre assim.
-Seu problema é muito simples – se você quer realmente conservar essa moça, dê um jeito de destruir a imagem diante da qual sua mãe reza.
Ele arregalou os olhos.
-Mas eu não posso fazer isto! Mamãe tem aquela Imaculada Conceição desde o tempo de mocinha, quando era aluna do colégio de freira!
-Se você não destruir a imagem – replicamos – duvido muito que se case algum dia. Sua mãe está usando aquilo como um foco de vontade para manter você preso.
-Mas se a imagem da Imaculada tem esse poder – ele ponderou – não será porque Deus não quer que eu me case?
-Se Deus não quer que você se case, que diferença faz a imagem? Mesmo que seja destruída, você não casará nunca. Mas se, como eu penso, sua mãe está utilizando a imagem para realizar o desejo dela de manter você preso, ela está abusando de um símbolo religioso para fins materiais e egoístas.
-Mas por que ela está fazendo isto? – ele se lamentou.
Há ocasiões em que é necessário sermos diplomáticos.
-Não duvido que ela tenha a melhor das intenções – dissemos. – Você sabe, para as mães nós somos crianças a vida inteira. – Percebendo que ele ainda hesitava, acrescentamos: -Olhe, a decisão é sua. Eu não vou destruir a imagem para você. Mesmo porque, se eu destruísse a imagem, não adiantaria nada. O gesto tem que partir do enfeitiçado, ou o feitiço não se quebrará.
Novamente ele arregalou os olhos; cremos que a idéia de uma imagem católica poder ser utilizada como feitiço nunca lhe ocorrera. Após um momento, perguntou:
-Como é que eu destruo a imagem?
-Da maneira mais simples. Você tem que inutilizá-la para fins de oração. Quebre-a em pedaços e jogue-a numa lata de lixo. Mas tome cuidado para que a lata de lixo não seja uma que sua mãe tenha acesso; se ela conseguir colar os pedaços da imagem, o feitiço ficará ainda mais forte do que antes.
Dois dias depois ele nos procurou novamente e confiou-nos que retirara a imagem do quarto, quebrara-a em diversos pedaços, e a caminho do trabalho jogara os pedaços num receptáculo de lixo publico.
-E o mais esquisito – cochichou – é que a mãe não disse uma palavra quando entrou no quarto e não viu a imagem!
O namoro desse rapaz com aquela particular moça (sentimos desapontar os nossos leitores mais românticos) não durou, por motivos que explicaremos adiante; mas alguns meses depois da destruição da imagem, a mãe desenvolveu sintomas de câncer e antes do fim do ano faleceu. A corrente de forças, perdendo seu ponto de apoio, repercutira contra ela.
Esta é uma possibilidade que sempre existe em casos de vampirismo: que o vampiro, desprovido de sua presa, perca as forças e morra. Não mencionáramos a possibilidade ao nosso consulente porque tínhamos certeza de que não teria destruído a imagem em tal caso.
Mentalidades superficiais ou pessoas de moralidade pouco desenvolvida ponderarão aqui, talvez, que encorajamos um filho a praticar um matricídio mágicko. Este absolutamente não foi o caso. Se as forças vitais que a mãe estava utilizando para conservar sua vida e energia fossem naturais de seu próprio organismo, a destruição da imagem não teria lhe causado qualquer dano físico. Nenhum ser humano tem o direito de se conservar vivo à custa do prana dos seus semelhantes. Para os iniciados, a morte é uma etapa da vida.
Já mencionamos que o vampirismo é contagioso: o namoro desse rapaz com a moça que o levou a destruir a imagem não continuou porque (conforme pudemos averiguar) ele começou a demonstrar para com ela o mesmo tipo de ciúmes doentio que a mãe tivera para com ele.
“Dize-me com quem andas, e te direis quem és”, é um desses truísmos que todo mundo repete sem lhes prestar atenção; no entanto é um formidável aviso no que se refere à Magick e ao misticismo. Uma pessoa vampirizada, perdendo sua energia, tende a absorver energia dos outros, e é encorajada a assim fazer pelo próprio vampiro, que deseja aumentar suas fontes de alimentação. Aprendendo os truques do vampiro à custa de sua própria experiência como vítima, ela começa ( na maioria das vezes sem se tornar cônscia do fato) a utilizar as mesmas técnicas que seu algoz. Usando ainda outro truísmo, “a prática leva a perfeição”: em muito menos tempo do que julgaríamos possível, a vítima se torna outro malfeitor.
George Cecil Jones, um dos dois únicos membros da Aurora Dourada, além de Aleister Crowley, que foram capazes de alcançar o Adeptado legítimo, (conhecido na AA pelo seu Nome Mágicko, D.D.S.) teve em certa ocasião um experiência curiosa. A mesma Srs. Firth, Dion Fortune, pediu sua ajuda num caso raro de perturbação mental que viera a seu conhecimento. (A Srs. Firth foi uma das primeiras mulheres psicanalistas da Inglaterra.)
Uma colega da Srs. Firth aceitara como paciente um certo jovem de família ilustre, o qual exibia sintomas periódicos muito semelhantes a ataques de epilepsia; e para poder fiscalizar o progresso de seu paciente com mais cuidado, consentira em hospedá-lo num apartamento que ela dividia com outra estudante, não de psicanálise.
Um fenômeno muito estranho começou a ocorrer assim que o paciente foi viver no apartamento: toda noite, quase à mesma hora, os cães da vizinhança começavam a latir e uivar furiosamente, e no mesmo instante uma janela de sacada, que dava para uma varanda, se abria e uma corrente de ar frio percorria o apartamento. Imediatamente após, o paciente hospedado entrava em convulsões, e a seguir sofria um desmaio prolongado.
Embora a janela de sacada fosse fechada à chave, e até barricada, assim mesmo se abria; e foi este fato inusitado que levou a colega de Dion Fortune a recorrer a ela, que sabia ser interessada em casos desta natureza.
A Srs. Firth indagou sobre os antecedentes do paciente, e ficou sabendo que este tinha um primo em segundo grau, também de família nobre, o qual tinha sido descoberto em flagrante na França, durante a guerra, praticando necrofilia com cadáver de um alemão. Graças à influência de sua família o jovem necrofílíaco não fora mandado para uma prisão militar, mas sim colocado sob responsabilidade de sua família como um caso de loucura. O jovem exibia sintomas semelhantes ao do primo, com ataques periódicos seguidos de prolongada coma, e foi posto sob os cuidados de um enfermeiro. Mas o enfermeiro, como todo mundo, tirou férias; e nessa ocasião o doente foi colocado sob os cuidados de seu primo.
Acontece que o primo também tinha tendências homossexuais, e o doente incitou-o à intimidade. Em certa ocasião, o necrofilíaco mordeu seu parceiro no pescoço durante o ato, com tanta força que chegou a tirar sangue.
Foi após esta particular ocasião que o primo começou a exibir os mesmos sintomas de epilepsia que o doente, o que levou a sua família a colocá-lo sob os cuidados da colega de Dion Fortune.
A Srs. Firth visitou o apartamento e examinou o jovem. Constatou que estava anêmico, e curiosamente indiferente aos seu próprio estado de saúde. Era como se estivesse resignado a morrer.
Aproximadamente às nove horas da noite, o mesmo fenômeno curioso se repetiu; os cães da vizinhança começaram a latir e a uivar, e a janela da sacada, embora barricada por uma pesada poltrona, abriu-se e um lufada de ar frio invadiu os aposentos. Ao chegar ao quarto do rapaz, este soltou um grito, curiosa mescla de prazer e medo, e após agitar-se de um lado para outro na cama, desfaleceu.
-Isto não é epilepsia – a Srs. Firth disse a sua colega – mas algo bem diverso.
-Você pode fazer alguma coisa? – perguntou a outra.
-Eu talvez não, mas conheço alguém que pode.
A Srs. Firth foi procurar George Cecil Jones, sob cuja supervisão ela se colocara após chegar a conclusão de que os Mathers haviam perdido contato com os Chefes Secretos. O adepto ouviu com atenção os sintomas do caso e finalmente declarou que gostaria de estar presente durante um ataque de nervos do paciente da sua colega.
-Eles sempre ocorrem mais ou menos à mesma hora – disse Dion Fortune, ou seja por volta das nove e meia, e dez da noite.
-A que hora, em geral, o primo dele vai dormir? – perguntou Jones.
A idéia não havia ocorrido a Dion Fortune, mas ela se informou por telefone, e ficou sabendo que o primo em geral se recolhia naquele mesmo horário, ocasião que seu enfermeiro se retirava para dormir.
-Sem dúvida nenhuma – disse Jones – eu gostaria de estar presente durante o próximo ataque.
Jones um farmacêutico conceituado e muito bem casado, explicou a esposa que provavelmente passaria a noite fora; e as oito estava no apartamento da colega de D. Fortune.
As nove e meia os cães começaram a latir; a janela de sacada abriu-se suavemente; uma corrente de ar frio percorreu a sala.
-Uma entidade muito desagradável acaba de entrar neste apartamento – declarou Jones. Está ali no canto da sala.
-Eu não vejo nada – declarou a colega de D. Fortune.
-Nem eu – confessou esta.
-Diminuam as luzes – disse o Adepto.
Duas lâmpadas foram apagadas, e as mulheres puderam ver uma espécie de brilho muito fosco num canto indicado por ele.
-Ponham a mão naquilo – disse Jones.
Elas assim fizeram e experimentaram um leve formigamento, semelhante àquele produzido por uma cãibra num membro dormente.
Jones dirigiu-se a janela de sacada e, mergulhando os dedos num vasilhame de água com sabão que preparara de antemão, pronunciou certas palavras e selou a abertura de toda sua extensão. No centro do piso ele traçou um pentagrama apontando para dentro, seguindo uma forma particular no traçado, e pronunciou um Nome em voz baixa.
-Está saindo da sala! – exclamou Dion Fortune, seguindo o clarão fosco com os olhos.
-Não conseguirá escapar – disse o Adepto. –Todas as vias de acesso estão seladas. Deixei a janela por último exatamente para que a entidade pudesse entrar.
-Como vamos destruí-la? – perguntou D. Fortune.
-Não vamos destruí-la – disse Jones. – Eu vou absorvê-la.
O brilho fosco – a única coisa que as duas mulheres podiam ver com os olhos físicos – recuou passo a passo através do apartamento inteiro, movimentando-se até as portas e janelas apenas para fugir delas. No quarto do paciente, este, de olhos arregalados, acompanhou a entrada de três pessoas (entre elas um quase desconhecido que viera previamente a seu quarto apenas para lhe molhar e fazer gestos Qabalísticos no ar) as quais pareciam saguaro alguma coisa que apenas um deles podia “ver”, e a subsequente saída do trio, sempre em perseguição de alguma coisa impalpável. A Srs. Firth comentou mais tarde que a expressão do jovem tinha sido muito engraçada, e que era pena que na ocasião ela não tivesse tido nem tempo nem disposição para rir.
A entidade finalmente foi encurralada no banheiro do apartamento, cuja basculante também havia sido selada por Jones; e quando tentou sair novamente, o Adepto colocou-se em frente à porta, recomendando às duas mulheres que ficassem de fora. Passo a passo, Jones avançou para o “brilho fosco” e finalmente “entrou” nele.
Dion Fortune, numa versão altamente glamurizada deste incidente, declarou que, ao terminar de absorver o vampiro, Jones caiu desfalecido. Tal não aconteceu: o Adepto ficou apenas um pouco tonto, e após sentar-se e tomar um dedo de conhaque recuperou-se.
O resultado desta aventura um pouco sensacional foi que não só o paciente da colega da Srs. Firth como o seu primo pararam de sofrer “ataques epiléticos”e recuperaram a saúde. O ex-combatente, entretanto, continuou a ser homossexual, e durante o resto da vida se tornou célebre na alta sociedade britânica por seus excessos. Estes, porém, foram sempre de ordem mundana, sem quaisquer sintomas de vampirismo ou outros fenômenos ocultos.
O paciente da colega da Srs. Firth confessou à sua psicanalista que sempre sentira que estava sendo atacado por algum “fantasma” quando tinha a crise; mas não ousara dizer isto a ninguém, por medo de ser considerado louco e internado num manicômio.
Jones, quando interrogado por Dion Fortune quanto à origem do vampiro, declarou que não fora um ser humano encarnado, nem um corpo astral habitado por um ser humano, mas apenas um cascão abandonado por alguma pessoa de hábitos parasitas (como um gigolô, um proxeneta, ou certos tipos de padres católicos e mulheres casadas), o qual fora atraído ao campo de batalha pelo sangue derramado; talvez mesmo o corpo astral do morto com o qual o primo mantivera relações anormais. A origem da entidade pouco importava: nas circunstâncias, ela pudera formar um laço magnético com o soldado; e mais tarde fizera o mesmo com o primo deste, no momento em que a mordida no pescoço derramara sangue.
Não deve ser concluído daí que uma mordida no pescoço ou em qualquer outra parte do corpo, com derrame de sangue, é indispensável à manifestação de um vampiro, ou resulta fatalmente em vampirismo! O fenômeno é de natureza eletromagnética, ou etérica, para usar a nomenclatura criada pelos teosofistas para traduzir os termos hindus.
A manifestação de vampiros pode ocorrer sem qualquer marca aparente no corpo físico.
Em casos, porém de anemia crescente e inexplicável pela medicina oficial, é possível que haja marcas materiais, pois a entidade responsável existe no limiar do mundo físico, como aquela do caso que acabamos de relatar. Mas tais marcas nunca são tão grosseiras como as tradicionais picadas gêmeas do romance de Bram Stoker ou dos filmes de vampiro! Quando suspeitamos que a emaciação orgânica é causada por um vampiro, devemos examinar a pele do paciente com uma lente de aumento. A lente tornará visível diminutos furos semelhantes a picadas de insetos. Segundo Dion Fortune esses furos se concentram mais no pescoço, principalmente debaixo das orelhas, em volta da ponta dos artelhos, ou nos seios. Mas Dion Fortune viveu numa época muito pudica, e não mencionou que tais furos também devem ser procurados na parte interna das coxas, entre as nádegas, e na virilha ou no púbis. Caso sejam notados no corpo de pessoas cujo Meio-Ambiente ou asseio pessoal invalide a possibilidade de serem causados por mosquitos, pulgas e percevejos, então está na hora de considerar a possibilidade de um vampiro, o qual pode, inclusive, estar encarnado e bem vivo, e ir a praia em pleno sol aos domingos!